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Nunca gostei de bonecas


Desde pequena tive aversão a bonecas. A ideia de ficar sentada numa pequena mesa fingindo tomar chá com aquelas pequenas criaturas de olhos grandes e vidrados era repulsiva e, por isso, sempre preferi estar do lado de fora da casa, brincando com meus vizinhos de jogar bola, subir em árvores, essas “coisas de meninos”.

Minha mãe odiava isso. Ainda me lembro de sua cara amarrada enquanto cuidava de meus arranhões ou costurava meus vestidos dos pequenos rasgos que os tombos causavam. As coisas melhoraram para ela depois que Megan, minha irmã mais nova, nasceu quando eu tinha 8 anos. A propósito, meu nome é Evanna e sim, eu odeio meu nome, sempre dando preferência ao meu apelido, Eva. Megan adorava suas bonecas e passava horas a fio brincando com elas em seu quarto. Mamãe comprava uma nova todo mês, muitas vezes mais de uma, e o quarto de Meg já estava lotado daquelas coisas dos mais variados tamanhos e formatos.

Bonecas grandes e realistas, pequenas e quase idênticas a bebês, de pano, de porcelana, que “faziam xixi” e “tomavam papinha”. Conforme eu crescia, era comum meus pais saírem e ficarem fora até tarde da noite, me deixando sozinha com Meg. Era odioso. Perdi as contas de quantos convites para festas ou baladas tive que recusar para tomar conta de minha irmã mais nova. Contudo, não era algo que eu pudesse negar, ou acabaria sem minha mesada e poderia esquecer meu tão sonhado carro quando completasse os 18 anos. Vocês devem estar pensando que ficar trancada em casa com minha irmã e perder as várias festas era o que havia de pior, mas deixe-me explicar melhor meu problema. Meg era aficionada por suas bonecas e, durante horas a fio, me obrigava a brincar com elas. Não eram experiências agradáveis e quase sempre resultava em pesadelos bem vívidos com bonecas ensanguentadas subindo em minha cama e puxando meus pés. Um dia, ou melhor, uma noite, quando eu tinha 17 anos (faria 18 em algumas semanas), durante as férias de verão, novamente meus pais saíram à noite e me proibiram de sair de casa. Na época, eu namorava um garoto chamado Josh, e meu pai não gostava nada disso, principalmente por Josh já estar na faculdade e ser alguns anos mais velho que eu. Tudo transcorreu normalmente até a hora em que me deitei para dormir.

Não demorou muito para que os malditos pesadelos com as bonecas começassem, mas daquela vez, algo estava diferente. Não era apenas o medo que eu sentia, mas também dor. Começou com uma ferroada em meu tornozelo direito. Olhei assustada para baixo e vi Rose, uma das bonecas de Meg, subindo em minha cama e agarrando meu pé com pequenas garras em suas mãos de pano, as quais certamente, não existiam ali antes. O pânico me invadiu, congelante, incapacitante e, durante alguns segundos, tudo o que consegui fazer foi olhar horrorizada para a pequena criatura que sorria para mim enquanto cravava suas garras em meu tornozelo. O sorriso demoníaco da boneca com pequenos e numerosos dentes afiados não ajudou a me acalmar. Finalmente, consegui romper o torpor do medo e gritei, dando um pulo e saindo de minha cama. Nesse momento, uma terrível verdade chegou a mim. Não era um maldito sonho! Eu estava bem acordada, machucada e tremendo, olhando diversos monstrinhos caminhando e se arrastando pelo meu quarto. Meu primeiro pensamento foi pular pela janela e fugir daquele quarto. Meu quarto ficava no primeiro andar da casa e, embora os vidros da janela pudessem me cortar, a queda não me machucaria. Mas havia algo a considerar: Meg. Minha irmã corria perigo e eu não poderia abandoná-la à sua própria sorte. Abri caminho entre as bonecas, chutando e empurrando, gritando alto sempre que um novo corte em minhas pernas era feito por elas. Com dificuldade, consegui chegar à porta e a abri com força, me preparando para correr para o quarto de Meg. Eu não estava pronta para o que eu vi. O longo corredor que separava meu quarto do de minha pequena irmã estava abarrotado de bonecas, a ponto de quase não ser possível ver o chão acarpetado embaixo delas. Com nada além do meu instinto de sobrevivência e de proteção por minha irmã, eu avancei, correndo e gritando, chamando Meg o mais alto que conseguia. Chutei, soquei, mordi e empurrei com toda a força que consegui reunir. Dezenas de novos cortes eram feitos em meu corpo já ferido, mas nada se comparou à faca cravada em minha barriga quando estava no meio do caminho. Sentindo meu sangue se esvair, caí pesadamente no chão e ali tive a certeza de que estava acabada. Estava certa de que nada poderia me salvar, mas não poderia desistir enquanto não alcançasse Meg. Eu precisava ao menos tentar salvar minha irmã, mesmo que eu não tivesse salvação. Me arrastando e tentando passar pela barreira de bonecas assassinas, finalmente consegui chegar ao quarto de Meg. Abri a porta e a vi deitada em sua cama, respirando pesadamente e sem nenhum dano aparente. Graças aos céus minha irmã estava bem e ainda dormindo.

Com ânimo renovado, me atirei pelo quarto ignorando os obstáculos e agarrei minha irmã sem cerimônia. Puxei-a para meu colo e corri em direção à porta de casa pulando por cima das bonecas quase escorregando na trilha que meu próprio sangue fazia na saída do quarto. Abri a porta da frente da casa com violência e cambaleei para fora, correndo o mais rápido que meu corpo conseguia para longe da casa. Cerca de 500 metros depois, meu corpo já não me obedecia mais e, por fim, entrei em um beco sem iluminação, me escorando na parede, prestes a perder a consciência. Sabia que não acordaria mais, mas estava feliz por ter conseguido tirar minha irmãzinha daquele pesadelo e, principalmente, pelo fato de ela nem ao menos ter acordado para vivencia-lo. Sentei-me naquele beco imundo com as costas apoiadas na parede apertando seu pequeno corpo firmemente ao meu, e sorri de olhos fechados, pensando em tudo o que havia perdido. Jamais veria meus pais novamente. Jamais beijaria Josh de novo. Jamais teria meu carro. Mas nada disso importava. Ao menos, Meg estava bem. Nos meus últimos momentos, um pensamento me ocorreu no exato momento em que minha irmãzinha finalmente dava sinais de que estava despertando e o gelo que desceu por todo meu corpo nada tinha a ver com a minha vida se esvaindo. Estávamos nas férias de verão. Megan passava as férias de verão na casa de praia de nossos avós. Megan não era tão leve e acordava com facilidade. Aquilo em meu colo não era minha irmã. Tudo foi em vão.


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